terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

De indulgências


E quando eu me dei conta do quanto eu havia sido ridícula parece que me libertei. O que hoje me parece é muito insano. Acho que boa parte das pessoas se vitimiza e põe nos outros a responsabilidade, mas a minha necessidade de sempre pensar que eu era a Senhora do controle, dos sentimentos, do sexo e das minhas emoções, me traía. Eu queria acreditar que era eu a responsável pelo nosso afastamento ou aproximação, porque... assim eu podia continuar alimentando a ilusão que eu sentia por você. Só que eu não era a responsável. Eu nunca fui a responsável.

Você me enganou. Você me iludiu. E me manipulou. Você me disse o que eu precisava escutar, porque sabia o que eu precisava escutar. Bem daquele jeito mesmo. Você usou minhas palavras, meus sentimentos, minhas esperanças e expectativas contra mim. Você usou meus textos contra mim. E eu não percebi.

Doeu perceber. Me rasgou perceber. Nunca achei que fosse um dia escrever essas palavras...
Você me enganou. Você me iludiu. E me manipulou. Você me fez de palhaça.

Acho que a intuição de que passei os últimos anos da minha vida me comportando como uma imbecil tentava me proteger criando pra mim narrativas de superioridade. Fictícias, densas e lindas. E, no meu imaginário, eu ressurgia gloriosa como numa cena final de filme ou de livro em que a mocinha permanece sozinha, mas quase como uma espécie de deusa. Foi muito doloroso descobrir (agradeço ao Freud pela ajuda) que eu inventava a narrativa... Para não me enxergar, eu me escrevia. Com o seu script. Você me conduziu, desenhou... me ensaiou. Você me deu as falas dos personagens que criei, burilou suas verdades, forjou seus traumas, porque sabia do que eu precisava. Você sabia do que as minhas histórias precisavam. Então me dava.

Eu confundi isso com amor e insisti até quase me destruir por falta de saber o que fazer quando me desse conta de que para você eu fui nada. Quando me desse conta do quanto me permiti enganar com a ilusão de que era eu que permitia ou deixava de permitir qualquer coisa. Beirei e ultrapassei o ridículo. Nem sei dizer quantas vezes. Te defendi, justifiquei. Te acreditei, te confiei. Por nossa culpa.

Eu não te odeio, sabe? Nem me odeio. Eu sinto uma espécie de nada, o que me parece é ser uma coisa muito boa. Eu não sinto sua falta, eu não sinto falta do que a gente viveu - o que quer que tenha sido -, eu não sinto saudade, ou raiva, ou asco. Ou dor. Eu não sinto indiferença. Eu sinto nada.

Eu sinto nada.

Você me enganou. Você me iludiu. E me manipulou. Mas descobrir isso, por incrível que pareça, me leva para o outro lado... um lado novo, desconhecido, um lado inesperado de mim. Descobrir que fiz sem perceber, por tanto tempo, um papel tão incompatível com o que sempre admirei, me faz descobrir que há um lado completamente novo de mim. Eu não sei que lado é esse. Eu não sei o que vou fazer com ele. Mas pela primeira vez em sete anos... ele está aqui. Eu consigo senti-lo. Ele está aqui.

Recomeçar pode ser bem difícil. Mas quando é de verdade e não só retórica de texto talvez faça mais que só sentido. Talvez me reconstrua. Talvez, só talvez, me reconstrua. Porque finalmente... porque finalmente, finalmente... Fim.

Elenita Rodrigues .

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